Brasil pode ter nova onda, após repiques das contaminações no exterior

Testagem para COVID em província da China
Além do confinamento de quase 30 milhões de pessoas, governo chinês decretou aumento dos testes e mais uma cepa, descoberta em Israel, se junta à Deltacron (foto: AFP)

 

Infectologistas consideram a possibilidade de surgimento de outra onda de contaminações pelo coronavírus no Brasil, após o recente aumento dos casos da doença respiratória na Europa, o surto que levou ao confinamento de quase 30 milhões de pessoas na China e a descoberta da variante Deltacron, a cepa mista AY.4/BA.1, combinação de duas linhagens já conhecidas do coro- navírus. Contudo, qualquer afirmação sobre uma fase de recrudescimento da COVID-19 no país seria precipitada. Na terça-feira, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, informou que foram identificados dois casos da Deltacron, no Amapá e no Pará.
Ontem, o ministério israelense da Saúde anunciou ter detectado dois casos de contágio por uma variante não identificada do coronavírus. No Brasil, ainda é cedo para conclusões sobre uma nova onda da infecção viral, na avaliação do infectologista Estevão Urbano, presidente da Sociedade Mineira de Infectologia e membro do Comitê de Combate a COVID-19 em Belo Horizonte. “O Brasil está com um cenário um pouco diferente porque ele tem um pouco mais de vacinados e adoecidos que a China”, analisa.
Para Urbano, o que pode preocupar é se, eventualmente, a nova variante tiver a capacidade de suplementar a imunidade gerada pelo grande número de infecções que se confirmaram no início do ano no país. “Ainda precisamos pesquisar e entender a tendência do espalhamento dessa cepa”, afirma.
O infectologista Geraldo Cunha, professor titular da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que tendo em vista a prevalência muito pequena no mundo da Deltacron, isso sugere capacidade que não seria muito transmissível da mutação. “O fato de ter poucos casos identificados no mundo é que dá pra falarmos isso”, diz.
Até ontem, foram registrados 47 casos da cepa no planeta, dos quais 36 descobertos na França. “Isso é uma questão que nos deixa um pouco mais tranquilos. Ela parece não apresentar grande risco nos rumos atuais da pandemia”, observa. Geraldo Cunha e Estevão Urbano acreditam que alguns estados estão se precipitando ao liberar a população do uso da máscara de proteção facial, inclusive em locais fechados.
“Temos municípios completamente desnorteados, como o Rio de Janeiro, que liberou a máscara em todos os lugares. Isso é muito prematuro e muito arriscado”, alerta Cunha. Para Urbano, a liberação das máscaras em locais abertos é seguro, mas ainda não é o momento de relaxar as medidas em ambientes fechados.
“O mais importante agora é liberar, se for o caso, somente em locais abertos. Todo o restante ainda é precipitado.” Em Belo Horizonte, o uso do acessório em locais abertos já é permitido desde o último dia 4. No estado, o governador Romeu Zema (Novo) anunciou o fim da obrigatoriedade do acessório em locais abertos como orientação para que os prefeitos municipais tomem a decisão.
Não vacinados Na Ásia e na Europa, o cenário da pandemia voltou a preocupar especialistas nas últimas semanas. O governo chinês começou a ampliar o número de leitos de hospital depois de anunciar, ontem, milhares de novos casos de contaminação provocados por um surto da variante Ômicron, que motivou o confinamento de milhões de pessoas no país. O país asiático registrou 3.290 novos diagnósticos, sendo 11 deles com gravidade. O número é inferior aos mais de 5 mil casos verificados na terça-feira, mas a variante contagiosa pressiona o sistema de saúde chinês e a estratégia de eliminação da doença.
Em Xangai, a cidade mais populosa da China, com 25 milhões de habitantes, as autoridades de saúde realizam testes de triagem em massa. A testagem avança também em outras cidades do país, como Shenyang, na província de Liaoning, ao Nordeste da China.
O número de casos positivos na Alemanha, Reino Unido e França somaram mais de 340 mil, segundo o mais recente levantamento feito pela plataforma Our World in Data, ligada à Universidade de Oxford, na Inglaterra. O Reino Unido encerrou fevereiro com média de 46 mil novos casos por dia. Na terça-feira, a média superou 103 mil registros.
O governo francês contabilizou mais de 800 mil novos casos de contaminação desde o início do mês, e os números também indicam estado de alerta. Áustria, Holanda, Grécia, Suíça e Itália também registraram aumento no número de casos desde o fim de fevereiro. Na Alemanha, o cenário é ainda mais preocupante. Em 15 dias, o país registrou mais de 2 milhões de novos casos. No último dia 28, a média foi de 158 mil diariamente. Ontem, a média de positivos para a doença chegou a 200 mil.
Ao analisar o cenário da doença na Europa, o infectologista Geraldo Cunha observa que as pessoas não vacinadas estão sujeitas a ter formas graves da doença. “O que a gente tem observado, onde você tem parcela da população em que o número de não vacinados é muito grande se tornam recorrentes esses repiques da doença”, afirmou.
* Estagiária sob supervisão da subeditora Marta Vieira

Braço da OMS nas Américas faz alerta

O aumento do número de infecções provocadas pelo coronavírus em diversas partes do mundo representa uma “advertência” para as Américas de que o vírus não está sob controle, apesar da diminuição do ritmo de contágio na região, alertou ontem a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Braço regional da Organização Mundial da Saúde (OMS), a entidade informou que os diagnósticos de COVID-19 aumentaram 28,9% na semana passada na região do Pacífico Ocidental, que inclui a China; 12,3% na África; e quase 2% na Europa em relação à semana anterior.
“Os casos aumentam novamente em outras partes do mundo, o que serve de alerta para a nossa região”, disse o vice-diretor da Opas, Jarbas Barbosa, em entrevista à imprensa. Nas Américas, os casos de COVID-19 continuaram em queda pela oitava semana consecutiva, com mais de 901 mil novos casos relatados na primeira semana deste mês, queda de 19% em relação à semana anterior. As mortes semanais mantiveram a curva descendente pela quinta semana consecutiva, com 15.523 óbitos relatados, o que significa redução de 18,4%, segundo a Opas.
Jarbas Barbosa afirmou que, embora a maioria dos países e territórios americanos tenha verificado recuo de novos casos, no Caribe e nas ilhas do Oceano Atlântico os casos aumentaram 56,6%. “As infecções e mortes por COVID-19 estão diminuindo na maior parte de nossa região, mas muitos casos e mortes ainda estão sendo relatados todos os dias, uma indicação clara de que a transmissão ainda não está sob controle”, enfatizou o vice-diretor da Opas. Devido ao risco que a pandemia ainda representa, a instituição pediu aos países das Américas para ampliarem as taxas de vacinação contra o coronavírus.
Dois anos após a OMS declarar a pandemia do novo coronavírus, 149 milhões de casos da doença foram relatados nas Américas, incluindo 2,6 milhões de mortes, segundo dados oficiais.
Sylvain Aldighieri, chefe de incidentes para a COVID na Opas, destacou que “grandes incertezas” permanecem em relação à situação global e regional da doença. “Um cenário de recrudescimento da circulação viral nos níveis subnacional, nacional, ou em uma região ou sub-região, é um cenário que sempre tem que estar presente no nosso radar epidemiológico”, ressaltou.

Sem gravidade

De acordo com o ministério israelense da Saúde, os casos de contágio detectados no país por uma variante não identificada do coronavírus não apresentam gravidade aparente. A mutação combinaria as subvariantes BA.1 e BA.2. “Essa variante ainda não é conhecida no mundo, e os dois casos foram descobertos graças a testes de PCR feitos no Aeroporto Ben Gurion, na entrada de Israel”, informou o comunicado divulgado pelo ministério. As pessoas infectadas, ainda segundo a autoridade sanitária, têm sintomas leves, incluindo febre, dores de cabeça e musculares, e não precisaram de cuidados médicos especiais.

Com Estado de Minas